texto crítico #13, 2021

Da banalidade da vida ao extraordinário do cinema

Conversa com o meu avô (2020), de Alina Chiaradia

por Vanessa Freitas

Bazin, em seu texto “Morte todas as tardes”[1], percebe que o cinema tem o poder de eternizar aquilo a que representa. Assim, ele figura como uma espécie de exaltação dos que já foram ou dos que um dia, infelizmente, irão. Nesse mesmo caminho, a realizadora Alina Chiaradia encontra, em uma conversa sobre tilápias, a imortalidade para seu avô, Paulo Roberto Chiaradia.

Conversa com o meu avô (2020) é um filme de três minutos que, como revela seu próprio título, conta sobre dois personagens, uma neta e um avô, em torno de um tanque de pesca. O filme se ancora na banalidade da vida, em uma conversa despretensiosa, para nos lembrar que a vida, a partir do encontro com a arte e com o fazer cinematográfico, é extraordinária.

A realizadora, assim, deixa que seu personagem vague e divague sobre as cores – é azul, é vermelho –, sobre o tamanho do tanque, sobre a quantidade de novas vidas que virão. Seu Paulo, com uma conversa mansa, estabelece um paralelo entre as três mil tilápias que nascerão e a falta de espaço no tanque onde estão destinadas. Nessa discussão, talvez, o espectador se pergunte se de fato Alina e Paulo conversam sobre peixes. Essa indagação parece ser uma das questões centrais: estamos diante de um filme sobre peixe? Tanques? Azul? Nascimento? Pertencimento? Vida? Partilha? Afeto? – Acredito nisso.

Nesse contexto, o filme não traz muitos cliques, cores e sons próprios da contemporaneidade expressa em outros filmes do Metrô. Na verdade, o espectador é convidado a entrar em outro tempo, a se adaptar a novos sons. Os personagens sentem o tempo, o dia e a vida em seu próprio ritmo. A pescaria, tema aparente, embala o filme e dá espaço ao diálogo. O espectador é convidado, então, a sentar, a ouvir seu Paulo. Somos, nesse momento, todos ouvintes aprendendo a ouvir.

Além disso, a riqueza do filme também se encontra nas imagens, no silêncio e na contemplação. Estar com Alina e Paulo é intimista, sensível e calmo. O filme permite, em dada medida, que acessemos lembranças ligadas à infância, repensemos o valor do idoso e do diálogo aberto. No Brasil de 2020/2021, estar com Paulo em Tremembé, interior de São Paulo, pode nos ajudar a encontrar um pouco de calmaria e de paz no meio da crise (sanitária, política e social) em que estamos submersos.


[1] BAZIN, A. “Morte todas as tardes” (1949). In: XAVIER, I. (org.). A experiência do cinema: antologia. Rio de Janeiro: Graal, 1983. p. 129-134.