Dirigido por Alerrando Pelaes Marques, Ana Beatriz Costa de Souza, Fernando de Carvalho Vaz, Gustavo Almeida dos Anjos, Deivid Souza Brazão, Ingrid Carol Maia dos Santos, Joabe Barata do Carmo, Maiane Estefany Rocha Fernandes, Manoel Vicente Cruza da Costa, Maria Fernanda Sanches, Zaquias dos Santos Pereira e Vitória Nascimento Farias
Ferreira Gomes é um município do Amapá que abriga três hidrelétricas em seu rio Araguari. Porém, a energia produzida é majoritariamente enviada a outras regiões do país, e os moradores locais são quem acabam prejudicados pela falta de abastecimento, encargos abusivos e os danos causados em suas bacias hidrográficas.
Confrontando essa questão premente da vida da comunidade ferreirense, um grupo de doze jovens formam o coletivo cinematográfico responsável por Pisca-Pisca, resultado de um processo de formação em cinema comunitário e educomunicação. A partir do documentário, colocam suas lentes e olhares à disposição das pessoas afetadas pela crise hídrica e energética, por vezes entrevistando seus próprios familiares. O que, em outra medida, quer dizer que eles mesmos enfrentam as dificuldades vividas após a privatização da CEA (Centrais Elétricas do Amapá) em 2021, assumida pela Equatorial Energia.
A produção, então, nasce desses atravessamentos políticos e da realização de um projeto sob a assistência de uma organização social, a Viração Educom. Este aspecto comunitário e de cunho cidadão perpassa a forma fílmica, onde as imagens produzidas pela equipe jovem adquirem ainda mais substância e irreverência pela montagem realizada por uma das educadoras do projeto, Lara Beck. Imagens essas que carregam certa capacidade expressiva na forma como simbolizam os problemas enfrentados cotidianamente pela comunidade, com os apagões constantes e as perdas e problemas acarretados pela má distribuição de energia. Tem um aspecto quase improvisado nas encenações que os jovens fazem de vizinhos que interagem após uma queda de luz, solidificando essa leveza na linguagem e demonstrando o diálogo entre as diversas frentes e olhares que se põe à feitura do filme.
Operam com estes elementos um exercício de extrema maturidade ao lidar com uma forma documental já tão carregada de vícios como é o modo de narração participativo, que enfatiza a relação entre cineasta e o tema abordado, preenchendo-o com certo frescor ao não permitir que a opacidade e dureza do problema sobreponha este senso de comunhão, de experiência coletiva; e mesmo assim, eles não roubam a atenção da problemática levantada com sua presença. Na verdade, a participação da equipe não só reafirma os pontos que estão sendo levantados, como dá nome, cara e sensibilidades aos afetados pela crise energética e ambiental.
Ao optar por expor durante toda a duração o fato de que são um grupo de jovens ferreirenses realizando um filme sobre a própria situação e de seus conterrâneos, reforçam os afetos presentes em tela, permitindo a nós observar este senso de cooperação e de uma experiência comum entre a população local. O pai, entrevistado pelo filho, emocionado ao falar do rio que é parte formativa de sua vida, e ao demonstrar orgulho do que aquelas crianças estão fazendo, é exemplo maior de como todos ali se importam uns com os outros e com a comunidade. Com isso, o filme nos mostra como se dedicar a uma causa humana, agir sobre ela e lutar por dignidade, respeito e igualdade são indicadores de uma forma de viver em sociedade diametralmente oposta ao que motiva privatizações e abusos por parte dos poderosos.