Para quem faz uso do transporte público da cidade de Curitiba, as cenas de Próxima Parada, dirigido por Daniella Shizuko, Marina Sartoreli, Ph Ribas e Sal Galarça, são muito recorrentes. A passagem cara, os terminais lotados, as condições dentro dos veículos e o próprio efeito sonoro característico de parte da frota – é tudo familiar. E para esse morador de Curitiba, já farto de escutar que diariamente usufrui do melhor transporte público do país, a revolta ao se deparar com essas problemáticas sempre chega com muito mais força.
Parte integrante da segunda mostra competitiva do Metrô, é curioso pensar Próxima Parada como elemento de uma sessão que trata de pertencimento. Com todas as controversas do transporte coletivo da cidade, como podemos invocar o sentimento de que pertencemos a ele, ou de que é algo que nos pertence? Parece complicado olhar por esse lado. No entanto, no fim das contas, ao estender um pouco o recorte e pensar no contexto urbano geral, acredito que o filme esteja no lugar certo. A cidade é contraditória, é desigual. Habitar esse espaço é habitar seus contrastes. Próxima Parada nos situa justamente nesse aspecto hostil de Curitiba, em uma de suas tantas contradições, e aborda esse problema explorando ainda mais discrepâncias.
A voz de Rafael Greca, um prefeito alienado às condições do próprio espaço em que opera, ressoa cheia de elogios ao objeto alvo da crítica do documentário, ao que intercalamos entre observar a sujeira dos terminais e a lotação dos veículos – por pessoas e insetos, inclusive. A narração de uma campanha política fala da ausência de filas enquanto imagens sobrepostas das multidões que aguardam nos terminais chegam aos nossos olhos. Essas sequências são parte de um dos pontos mais fortes da obra: saber usar a montagem como forma de denúncia, armando-se das palavras dos próprios detentores do poder.
Em relação aos locais contemplados, há um evidente recorte geográfico na região do bairro Boqueirão, mas não encaro esse aspecto como um problema. Claro, existem tantas outras linhas de ônibus problemáticas em pontos diversos da cidade, que renderiam infinito material à obra. No entanto, vejo o conteúdo como suficiente dentro do que os diretores se propõem a documentar, afinal, as cenas escolhidas já são capazes de oferecer a dimensão do problema. A revolta está presente, a crítica às falsas promessas também.
Próxima Parada é capaz de dialogar diretamente com a população de Curitiba, usando de cenas cotidianas e do próprio gatilho sonoro que dá nome à obra para instigar uma possível mudança. Com uma câmera na mão e um sentimento de revolta, produziram uma peça dotada de poder social — que ao retratar a revolta silenciosa dos usuários, torna-a visível e audível, propondo uma nova leitura do espaço público e das dinâmicas de poder que o moldam.